hoje participei como moderador de uma sessão sobre saúde e estado social, onde o que acabou por ser notícia foi a aplicação à cobertura jornalística da chamada “Chatham house rule“. Esta regra solicita que não sejam atribuídas posições a pessoas. Tem como objectivo permitir que os participantes possam focar no que estão a dizer com toda a liberdade, sem terem a preocupação de “fazer declarações para os meios de comunicação social”. É uma das formas usualmente consideradas como propiciadoras de um debate franco sobre os temas em causa.
A restrição da não identificação de quem afirmou o quê é uma limitação ao exercício da actividade jornalística, mas que em contrapartida poderia ter a vantagem de uma discussão mais interessante e mais focada no conteúdo.
A aplicação deste tipo de regras não deve ser entendida como tendo a intenção de limitar a liberdade de imprensa, e sim como forma de fomentar o debate. Em várias ocasiões, nacionais e internacionais, participei em discussões onde estas regras foram aplicadas, e onde realmente a discussão foi mais franca, sem cada parte estar com a preocupação quase exclusiva de defender as suas posições públicas.
A existência de um debate sério em várias áreas é reconhecida como necessária. A existência de um trabalho de cobertura jornalística profunda e séria é igualmente essencial como parte da liberdade cívica. Encontrar forma de compatibilizar os vários aspectos é por vezes necessário. A Chatham house rule é uma possibilidade de o tentar fazer.
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15 de Janeiro de 2013 às 20:02
O pequeno problema é que a organização se “esqueceu” de avisar os jornalistas antes do evento. Eu já participei em eventos com este tipo de regra mas elas foram consentidas pelos jornalistas. Um acordo mútuo portanto. Mas o pior de tudo é a organização prontificar-se a enviar um “resumo de imagem e som aos jornalistas no fim do dia”. Isto já é pisar todas as regras e é inaceitável para um jornalista. Finalmente e na minha opinião, se o debate é tão importante e se faz num sítio aberto e público, com a presença da imprensa, não faz sentido limitar o trabalho jornalístico. Houve uma leve falta de jeito.
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15 de Janeiro de 2013 às 20:44
“Eu já participei em eventos com este tipo de regra mas que foram consentidas pelos jornalistas”.
Será que entendi bem: consentidos pelos jornalistas? Consentidos? Será que já existe mesmo o quarto poder?
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Pingback: Incompetências – Aventar
15 de Janeiro de 2013 às 22:43
Desculpar-me-á, mas não considero sério invocar uma regra de mútuo consentimento nascida no seio de um organismo privado para aplicação a uma reunião promovida por um governo para debater a causa pública num lugar público e para a qual a imprensa foi convidada sem nenhuma restrição.
Percebo que queira defender a organização, ou pelo menos colocar água na fervura.
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15 de Janeiro de 2013 às 22:57
Em teoria, pode se discutir um coinjunto de opções que violem a constituição? sendo assim tb os podemos esperar cá fora com outros argumentos. Estranho no entanto a divulgação do governo e da participação de membros do governo e tb não percebo como poderei eu como cidadão perceber o que se discutiu.
Cá os esperamos à porta aberta.
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15 de Janeiro de 2013 às 23:11
Caro Paulo Querido,
Tendo estado como moderador numa sessão, desde o início foi claro para mim que não era organização do governo, embora houvesse daí um “empurrão” para a realização; foram-me comunicadas as regras a seguir desde o início, não tendo havido porém qualquer obstáculo a que a sessão em que estive fosse em “on” por acordo dos oradores.
Pessoalmente, vejo valor na regra como forma de estimular a discussão. É aliás usada em muitos sítios, com ou sem conhecimento dos participantes nas reuniões.
Compreendo os vários argumentos contra a utilização da regra neste caso concreto. Mas não me parece que tenha colocado a liberdade de imprensa em perigo. Sobre como a organização comunicou, em tempo e modo, a regra desconheço.
Caro António,
Em teoria, pode-se discutir tudo, embora depois se deva ter em conta as condições de aplicação possíveis. Constitucionais e outras. Sobre perceber o que se discutiu, apenas posso assumir o compromisso de fazer aqui uma descrição do meu entendimento das sessões em que estiver presente.
Um agradecimento ao Ricardo Horta por comentários de correcção ao texto.
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21 de Janeiro de 2013 às 12:35
Desculpe, mas estas regras fazem-me lembrar as do Clube Bilderberg, onde são decidos os destinos do mundo à porta fechada. Na minha modesta opinião, não compreendo que alguém se sinta inibido pela presença dos jornalistas, a não ser que tenha falta de carácter para assumir as suas posições sobre matérias tão importantes como aquelas que estiveram em discussão.
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15 de Janeiro de 2013 às 23:42
Há muito tempo que o jornalismo se reduziu a pés-de-microfone. Montar o tripé e gravar o falante é tudo quanto os pseudo jornalistas de hoje são capazes de fazer. Não os deixar montar o tripé é o maior atentado porque eles acham que o seu trabalho é só esse.
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16 de Janeiro de 2013 às 00:35
16 de Janeiro de 2013 às 01:16
“Artigo 48.º
Participação na vida pública
[…]
2. Todos os cidadãos têm o direito de ser esclarecidos objectivamente sobre actos do Estado e demais entidades públicas e de ser informados pelo Governo e outras autoridades acerca da gestão dos assuntos públicos.”
http://www.parlamento.pt/Legislacao/Paginas/ConstituicaoRepublicaPortuguesa.aspx
Passe bem!
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16 de Janeiro de 2013 às 10:29
Não me parece que esse tipo de proposta, feita nos moldes em que o foi, possa ser considerada aceitável numa sociedade democrática e que se quer transparente. Uma coisa é “negociar” previamente a liberdade e termos da informação a disponibilizar. Outra, bem diferente, é apresentar tudo de forma unilateral e como facto consumado. As pessoas têm de ter a honestidade intelectual de não dizerem em privado uma coisa para depois dizerem outra em público. Para folclore já basta o que temos.
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16 de Janeiro de 2013 às 11:56
Caro Pita Barros,
Qual, das “várias ocasiões, nacionais e internacionais”, em que participou com semelhantes regras, é que foi promovida pelo governo do país em causa? Em Portugal não foi, pois esta atitude é inédita. É que o seu argumento só é válido e só faz sentido assim, caso contrário está mesmo a misturar tudo. O dever de informação que se exige numa cerimónia organizada pelo Governo (mesmo que em parceria com quem quer que seja, como parece ser o caso) não é igual ao que se pede num encontro promovido por uma universidade ou fundação privada.
Se o primeiro-ministro quer conhecer a opinião de vários especialistas, “com toda a liberdade, sem terem a preocupação de “fazer declarações para os meios de comunicação social”, pode sempre convidá-los para São Bento. Uma cerimónia pública com o aval do executivo é isso mesmo: pública. Comparar o incomparável, como diz o Paulo Querido, não é sério.
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16 de Janeiro de 2013 às 12:56
A “Chatham House” é uma associação não governamental, isto é, privada, com estatutos e regras de conduta aprovaddos pelos associados, sob proposta da direção. Quer isto dizer que, para participar nas numerosas conferências sobre relações internacionais, algumas das quais dadas por membros do Governo britânico e altas personalidades estrangeiras, existe a “Chatham House Rule”. Quem quer assistir a essas conferências tem de ser sócio (inclusivamente os jornalistas) e cumpre os estatutos e as regras de conduta, ou pura e simplesmente é expulso da associação. A Chatham House não distribui resumos filmados das conferências, embora os sócios correspondentes (que estão também sujeitos à Chatham House rule” tenham acesso na sua área pessoal ao relato da reunião.
A descrição da “Chatham House rule” pelo Professor Pedro Pita Barros é uma caricatura da mesma, pois esta não é apenas aplicada a jornalistas, nem os jornalistas podem participar nas reuniões se não forem sócios. E todos os sócios são tratados por igual.
Finalmente, lamento informar que algumas associações cívicas portuguesas usam a “Chatham House rule” nas suas reuniões com personalidades de relevo, nacionais e estrangeiras, com o objectivo de permitir uma maior liberdade de troca de pontos de vista. O acesso a essas conferências é reservado aos sócios.
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16 de Janeiro de 2013 às 15:34
Pode uma discussão ser “mais franca, sem cada parte estar com a preocupação quase exclusiva de defender as suas posições públicas”?
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16 de Janeiro de 2013 às 17:52
A indignação provém de um “sector” ávido de discursos, comentários e opiniões que sustentem a sua política de distorção das palavras com arma de arremesso político. Ficam zangados pois claro, como se lhes tirassem (que acham ser seu direito) essa oportunidade de enterrar ainda mais o debate de ideias (seja ele bom ou mau) que se faz em Portugal.
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16 de Janeiro de 2013 às 19:24
Caro Pedro Sales,
A conferência não me foi apresentada como sendo organizada pelo Governo. Não tive, até entrar no local, qualquer contacto com qualquer membro do Governo. Estiveram presentes? sim. Se isso faz deste um evento público do Governo tenho dúvidas.
A reserva de identificação de posições individuais foi importante para alguns participantes, que preferem não estar nos holofotes
da comunicação social. Podem até nem verbalizar esse conforto.
Caro João Arez,
Conforme diz, as regras foram aplicadas a todos os participantes e não apenas aos jornalistas. Como moderador e participante, recebi mensagem de correio indicando as regras aplicáveis às sessões na semana passada. Obrigado por confirmar a utilização regular da regra em Portugal.
Caro Pedro Rodrigues,
a resposta é sim ! houve exemplos disso, na minha visão.
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17 de Janeiro de 2013 às 18:03
Recebido via LinkedIn: “Numa perspectiva diversa, escrevi mais ou menos a mesma coisa sobre o tema. http://lpm.blogs.sapo.pt/935761.html“
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